Os
índios que lutam para permanecer na Aldeia Maracanã, no Rio, ganharam
mais um apoio neste sábado. O deputado federal (PT) Domingos Dutra,
presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos
Deputados (CDHM), divulgou nota na qual reforça sua solidariedade aos
indígenas
, critica a "pressa" com que os governos municipal e estadual querem
desocupar o prédio, cobra explicações imediatas e lamenta a situação dos
índios: "Que infelicidade (...): carregam um sofrimento que começou com
a chegada de Cabral em 1500 e ainda são perseguidos por Cabral."
Na
última sexta-feira, a polêmica da remoção dos índios ganhou novos
capítulos. Ao mesmo tempo que negociava, através da Secretaria de Estado
de Assistência Social e Direitos Humanos (Seasdh), uma proposta para
retirar os indígenas do prédio do Antigo Museu do Índio, o Governo
Estadual, por meio da Procuradoria Geral do Estado, ingressava no 5º
Ofício de Registro de Títulos e Documentos com uma ordem de despejo
contra os moradores no imóvel. No último dia 16, enquanto ouviam da
Seasdh a boa notícia de que poderiam ter um Centro Cultural dos Povos
Indígenas e o Conselho Estadual de Direitos Indígenas, os índios eram
alvo de um ato que os obriga a deixar o imóvel em até 10 dias.
O
pedido da Procuradoria de Patrimônio e Meio Ambiente exige urgência na
retirada dos moradores do imóvel por conta da "premência de execução das
obras de ampliação e modernização do entorno do Estádio do Maracanã".
No entanto, segundo o cacique da Aldeia Maracanã, Carlos Tukano, que
tinha a notificação em mãos, "ninguém assinou o recebimento do
documento".
Nesta sexta-feira (18), em visita ao imóvel, o
procurador Federal dos Direitos dos Cidadãos, Aurélio Virgílio Veigas
Rios, prometeu adotar "as medidas judiciais necessárias para evitar a
demolição". O representante do Ministério Público Federal prometeu
conversar com a secretária de Direitos Humanos da Presidência da
República, Maria do Rosário, com o ministro da Justiça, José Eduardo
Cardozo, e a presidente da Fundação Nacional do Índio, Marta Maria do
Amaral Azevedo.
"Como procurador, devo buscar a interlocução.
Buscarei informações junto a colegas da Defensoria Pública da União para
adotar as medidas contra a demolição", disse Virgílio. "Estacionamento e
shopping existe em qualquer lugar, qualquer prefeito e governador podem
fazer isso. Agora, preservar um prédio onde há, claramente, a vivência
experimental dos povos indígenas é para poucos. A demolição é um ato de
imposição desnecessário. Temos de reabrir o canal de diálogo para
preservar este prédio, que representa o patrimônio histórico e cultural
de todos os brasileiros".
Também em visita ao polêmico prédio, o
procurador da República dos Direitos do Cidadãos do Rio de Janeiro,
Alexandre Ribeiro Chaves, destacou a importância da guerra judicial que
envolve o imóvel e, principalmente, as manobras desse embate entre
indígenas e autoridades fluminenses.
"Temos de estar atentos e
nos certificar de que só haverá qualquer tipo de ato material, como a
demolição por exemplo, quando estiverem extintos todos os recursos
cabíveis", alertou. "Não adianta demolir e depois a Justiça decidir
favoravelmente à manutenção do prédio".
Possível reviravolta
Presidente
da Fundação Darcy Ribeiro, Paulo Ribeiro, sobrinho do antropólogo que
dá nome à organização, afirmou que existe um documento que mudaria os
rumos do prédio, e estragaria os planos do Governo Estadual e outros
interessados no espaço. Segundo Ribeiro, ao doar a área, em 1865, o
príncipe Ludwig August de Saxe-Coburgo-Gotha (1845-1907) — conhecido
como 'duque de Saxe', por conta de sua paixão pelas ciências
naturalistas, exigiu, ad eternum, que o terreno deveria ser utilizado
com finalidade de apoio 'à causa dos índios'.
"Este documento
está no Arquivo Nacional, mas ainda está sendo procurado", alegou ele,
que disponibilizou as sedes e equipes da Fundação Darcy Ribeiro para
apoiar a Aldeia Maracanã. "Em posse deste papel, caso o Museu do Índio
tenha outra destinação que não seja ligado aos índios, a família do
duque de Saxe pode, inclusive, exigir a reintegração de posse do
terreno", concluiu Paulo Ribeiro.
Veja a nota do presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM), deputado Domingos Dutra:
NOTA DE APOIO
A
Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM)
se solidariza com o povo da Aldeia Maracanã, comunidade indígena que se
opõe à desocupação e à demolição do prédio do antigo Museu do Índio no
Rio de Janeiro.
A CDHM entende que o progresso e as melhorias
pretendidas para a capital fluminense são necessárias, mas o poder
público e a iniciativa privada só podem levá-las à frente sempre que
esse projetos atenderem o que a lei prevê e num claro e justo acordo com
a sociedade.
O coletivo parlamentar que presidimos ademais vê
com preocupação a mobilização de intenso aparato policial para cerco ao
local e a pressa com que os governos municipal e estadual do Rio de
Janeiro querem fazer a retirada dos ocupantes do prédio. É inaceitável
que, no estágio atual da democracia brasileira, um governador estadual,
integrante de um partido da base de apoio ao governo presidencial,
democrático e popular do PT, utilize métodos da ditadura para solução de
problemas socais.
A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos
Deputados acompanhará os acontecimentos e pedirá explicações imediatas a
autoridades regionais e federais, a fim de, além de tentar evitar o
pior, buscar uma solução madura e de consenso.
A realização de
um bom evento esportivo internacional não pode se dar à custa do enterro
da memória nacional, expresso neste momento pelos povos indígenas, que
foram dizimados ao longo destes 513 anos da descoberta do Brasil.
Que
infelicidade a dos índios brasileiros: carregam um sofrimento que
começou com a chegada de Cabral em 1500 e ainda são perseguidos por
Cabral.
Dep. Domingos Dutra - presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM)